Nissan Sentra 2023 volta por cima?
Texto e fotos de Henrique Koifman
Em março deste ano, falamos aqui no blog Rebimboca sobre a chegada do Nissan Sentra 2023 ao nosso mercado, uma volta do modelo que já foi vendido aqui em outras gerações e que retorna de olho no algo esvaziado segmento dos sedãs médios e com uma estratégia de preço ousada. Agora, que tive a oportunidade depois de passar uma semana (e cerca de 450 km) com sua versão mais cara, a Exclusive Premium – rodando na cidade e, também, fazendo uma pequena viagem para a serra –, estaciono ele novamente nestas páginas para contar como foi a minha experiência e tentar responder à pergunta do título.
Começando com o Sentra em movimento
Como mencionei acima, durante o tempo que passei com esse Sentra, alternei alguns dias de uso rotineiro em cidade com uma viagem (de totais 200 km). Na parte urbana, encarei alguns engarrafamentos e aqueles trajetos típicos por ruas e vias expressas com velocidades raramente constantes. E nessa situação, esse sedã se comporta de forma exemplar. É macio, silencioso e seu câmbio automático CVT gerencia com suavidade o trabalho do motor, simulando oito marchas.
Embora não siga a receita mais comum hoje em dia, com um motor turbinado de pequena cilindrada, a Nissan não ficou parada e, nesta geração do Sentra, substituiu o antigo 2.0 aspirado tradicional por outro propulsor, também de 2.0 litros e 16 válvulas aspirado e movido apenas por gasolina, mas de tecnologia um pouco diferente. Ele funciona no ciclo Atkinson (e não no ciclo Otto, o mais comum) e resumidamente, opera com um regime diferente de abertura e fechamento das válvulas para os cilindros, de forma a produzir maior eficiência.
Esse motor 151 cv de potência e 20 kgfm de torque, que no trânsito dão com sobras para rodar com conforto, arrancar e retomar velocidades com suavidade. E, sem maiores preocupações em poupar combustível (sequer me lembrei de acionar a tecla ECO, que ajusta o funcionamento com esse objetivo), nesse período, registrei perto de 10,5 km/litro de gasolina.
Sentra sobe a serra
Pegando a estrada, comecei por um trecho de uns 30 km planos e de bom asfalto, com trânsito livre e velocidades máximas de até 110 km/h. Nesse ambiente, o Sentra desliza sereno, mantendo o ritmo com giros baixos. A direção é precisa e o fluxo de ar em torno do carro é praticamente perceptível.
Ao chegar à subida da Serra de Petrópolis, o “cenário sonoro” se alterou um pouco. Embora esteja longe de ser fraco para os pouco menos de 1.400 kg do carro, o motor pediu mais giros para vencer as ladeiras e se fez ouvir mais constantemente em nossos ouvidos. Por outro lado, mesmo com o piso um pouco irregular da antiga pista de concreto, cheia de juntas e emendas, o conforto seguiu absoluto. E fazer as curvas, mesmo as mais fechadas e em velocidades um pouco mais altas, foi um prazer. A estabilidade é ótima, graças a um acerto preciso da suspensão – com o tradicional sistema McPherson na dianteira e do tipo multibraço (multilink) na traseira. Ela consegue ser firme, mantendo o carro neutro e sem adernar, sem passar desconforto praticamente nenhum aos passageiros.
Na descida para o Vale do Paraíba, pela primeira vez, acionei as borboletas atrás do volante (paddle shifters) para manter o câmbio um pouco mais reduzido e usar o freio motor. De um modo geral, no entanto, o câmbio CVT cuida muito bem do recado, respondendo até com certa agilidade aos chamados do acelerador. Os tempos em que caixas de marchas desse tipo transformavam a experiência de direção a algo semelhante a usar uma enceradeira, felizmente, se foram.
Com a estrada novamente correndo por bom asfalto e traçado menos sinuoso, a suavidade total voltou a dar o tom. Sem grandes arroubos de esportividade – até porque nem é mesmo esse o seu propósito –, o Sentra está naquela categoria dos carros que são bons de dirigir pela precisão e tranquilidade da coisa, característica daqueles modelos que os americanos costumam chamar de “cruzadores” (tradução aproximada minha), veículos para se viajar por longas distâncias, com boas velocidades médias e muito conforto.
Pelo computador de bordo, a média de consumo nesse trecho entre serra e estrada plana ficou pouco abaixo dos 13 km/litro.
Sentra evoluiu bastante
Vale dizer que Sentra esteve presente por aqui desde os anos 1990, quando estreou em sua quinta geração (a atual é a oitava) e que, embora tenha ajudado a marca a conquistar sua boa fama, nunca chegou a ser exatamente um fenômeno de vendas em termos de volume, ainda que – pelo menos aqui no Rio – vejamos muitos exemplares dessas séries anteriores rodando, firmes e fortes.
E é exatamente por estar acostumado a ver as gerações anteriores do Sentra por aí que me surpreendi (positivamente, adianto) com esta nova. Na comparação, mesmo descontando o peso da idade das antecessoras, o modelo 2023 está muitos e muitos furos acima em termos de design, com um estilo que é, ao mesmo tempo, classudo e arrojado. As linhas são fluidas, passando a impressão de serem extremamente aerodinâmicas – e, pelo consumo de combustível, são mesmo – e a combinação do desenho com cores e texturas é de extremo bom gosto.
Não que ele destoe tanto assim das tendências adotadas pelas outras grandes marcas, mas ficou com um jeitão de modelo de classe superior. Vá lá que os R$ 175 mil pedidos por um exemplar “completão” idêntico ao dessas fotos não sejam exatamente acessíveis – a versão um pouco mais simples, a Advance, sai por pouco menos de R$ 150 mil. Ainda assim, na comparação geral, sob esse aspecto, ele faz bonito (com trocadilho).
Interior sofisticado do Nissan impressiona
E faz ainda mais bonito quando você abre a porta, entra e se senta no Sentra (perdoe-me pela irresistível aliteração). Especialmente nessa versão topo de linha Exclusive Premium, que por pouco menos de R$ 2 mil a mais que a Exclusive “comum”, vem com um acabamento interno especial em couro na cor Sand. Bancos e partes dos painéis frontal e das portas são caprichosamente forrados nesse belo tom de caramelo, passando – novamente – a impressão de que se está em um carro pelo menos 30% mais caro.
Os bancos, aliás, merecem uma menção especial. Faz tempo que a Nissan – ao lado da Volvo – se destaca nisso. Batizado de “zero gravity”, o conjunto de assentos impressiona pelo conforto. Mesmo depois de muitas horas ao volante, ou de carona, não há cansaço. E, para motorista e carona, o apoio é quase perfeito, escorando o corpo em curvas mais fechadas com perfeição, como eu pude comprovar nas curvas da Serra de Petrópolis.
O espaço interno, como é de se esperar em um modelo desse segmento (são 2,71 m de entre-eixos), é muito bom para quatro passageiros – um quinto, no meio do banco de trás, já não terá assento tão confortável, por conta do apoio de braço embutido no encosto. Por conta do desenho da carroceria, com caimento para trás, porém, gente com mais de 1,80 m viajando no banco traseiro ficará com a cabeça bem próxima do teto. No porta-malas cabe o equivalente a 466 litros de bagagem.
Pacote de conforto é bom, mas faltam alguns detalhes
No mais, há teto solar com acionamento elétrico, partida remota do motor (pela chave, que é do tipo presencial), a central de multimídia conta com um ótimo sistema de som da Bose com oito alto-falantes, o painel de instrumentos combina dois mostradores analógicos (velocidade e conta-giros) com uma tela de TFT de sete polegadas customizável e a ergonomia é quase sempre muito boa, sem que você precise se esticar ou procurar muito para encontrar o que deseja.
É... no meio de tanto capricho e beleza, fica até difícil apontar defeito, mas lá vou eu cumprir o meu papel de cri-crítico e listar algumas “ausências” sentidas. Por exemplo, o ar condicionado funciona silenciosamente em duas zonas e tem comandos digitais, mas, estranhamente, não há saída de ar para o banco de trás. A Central de multimídia oferece boa conectividade para Apple e Android – mas é emparelhada somente por fio, assim como o carregamento de celulares que, hoje, já é feito por indução até em carros mais simples.
Além disso, embora haja acendimento automático de faróis (que são em LED), com ação inteligente – que baixa o facho quando há carros na mão contrária e acende as luzes de neblina para acompanhar curvas mais fechadas –, não há acionamento automático dos limpadores de para-brisa em caso de chuva. E isso fica ainda mais estranho, quando você descobre que a velocidade dos limpadores, sempre que alterada, é mostrada na tela do (ótimo) computador de bordo, no centro do painel de instrumentos. Nos elevadores elétricos dos vidros, apenas o do motorista conta com a função de “um toque”. Nos demais, segure o botão até fechar ou abrir a janela.
Mas a “cereja murcha” do bolo é o freio de mão – que, na verdade, é de pé. Enquanto a maioria dos modelos atuais razoavelmente sofisticados já vêm com acionamento elétrico para o travamento das rodas, no Sentra isso é feito por meio de um pequeno pedal, localizado mais ou menos onde ficaria o da embreagem em um carro manual. Um sistema que já foi comum por aqui, também – e ainda é usado em alguns utilitários, sobretudo picapes – e que ainda é popular na América do Norte (esse Sentra é produzido no México, também para o mercado dos EUA) – mas que destoa bastante da modernidade e sofisticação geral do modelo. Nada com que você não se acostume rapidamente, claro.
Essas “lacunas” se explicam muito provavelmente pela necessidade de chegar a um preço mais baixo (que ele tem) que a de seu principal concorrente, o campeão de vendas Toyota Corolla, em suas versões não híbridas mais sofisticadas. Dá até para imaginar as longas reuniões entre engenheiros e o pessoal do comercial da Nissan, discutindo o que incluir e o que tirar do carro.
Pacote de segurança é caprichado
A economia, no entanto, felizmente passou longe dos recursos de segurança. Desde a versão de entrada, ali estão alerta avançado de colisão frontal, assistente de frenagem, alerta para distrações do motorista, seis air-bags e freios a disco nas quatro rodas (que são de liga leve de 17 polegadas). E a Exclusive traz também alerta de tráfego cruzado traseiro, alerta e assistente de mudança de faixa, os já mencionados faróis automáticos inteligentes (que não ofuscam quem vem na mão contrária), monitoramento de ponto cego e simulação de visão 360º inteligente (uma tremenda mão-na-roda em manobras), com detecção e alerta sobre objetos em movimento – que usa radar e câmera combinados.
Sedãs médios já foram os tais
Houve um tempo em que os sedãs de porte médio estavam entre os automóveis mais desejados pela classe média. Estilo, conforto, espaço e, geralmente, performance – no mínimo – um pouco acima da média geral eram atributos atraentes e centenas de milhares de compradores os escolhiam todos os anos. E se você fizesse uma pesquisa entre os motoristas de outros tipos de carro, como hatches compactos e caminhonetes (peruas), é bem provável que boa parte deles dissesse que, se pudesse, trocaria seu carro por um daqueles modelos de três volumes, mais caros.
Só para refrescar a memória, eis aqui alguns dos muitos modelos desse tipo que você poderia comprar novinhos nas concessionárias até a década passada, mas que não estão mais disponíveis no Brasil: Chevrolet Vectra, VW Passat, Citroën C4 Lounge, Peugeot 408, Fiat Linea, Ford Focus sedan, Ford Fusion, Renault Fluence, JAC J5, Hyundai Azera... peço desculpas se me esqueci justamente daquele de que você mais gostava.
O tempo passou, o tempo voou, e o posto de queridinho do mercado foi ocupado pelos esportivos utilitários, os SUVs – mas não se preocupe, não vou novamente escrever aqui que esses carros mais altos e pesados são, quase sempre, um tremendo desperdício de aço, espaço e combustível. Ops, já escrevi.
O fato é que, hoje, sedãs de porte médio como o Nissan Sentra e seu principal rival, o Toyota Corolla, passaram a ser quase modelos “de nicho”, mais desejados e, quem sabe, até mais comprados para uso profissional (em frotas ou por empresas, para seus executivos) que por particulares. Isso, no entanto, não tirou deles nenhuma de suas boas qualidades – a não ser, claro, a de serem os carros da moda.
Mas afinal, vale a pena comprar um Nissan Sentra?
Se você não se rendeu aos SUVs, seja por racionalidade, implicância ou porque prefere modelos mais equilibrados (e prazerosos de se dirigir), sim, vale a pena. Na prática, ele é neste momento a alternativa mais próxima ao (ótimo) Toyota Corolla, se diferenciando dele em estilo e, de um modo geral, com certa vantagem no custo-benefício. Especialmente nesta versão testada, a Exclusive Premium, que traz um acabamento interno com aparência e qualidade dignos de modelos muito mais caros.
Embora não seja, como o rival, produzido aqui no Brasil, o Sentra é um modelo da Nissan, que está estabelecida aqui há tempos e, como a conterrânea, goza de merecida fama de qualidade e confiabilidade – embora, vale assinalar, esteja ligeiramente abaixo em termos de valor de revenda.
Como era a geração anterior só Nissan Sentra
Confira aqui, diretamente da máquina do tempo, nosso teste com a geração anterior (a sétima) do Nissan Sentra, em vídeos do início da TV Rebimboca:
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